"Nunca vi choro tão bandido..."

Blog-Homenagem dedicado "a todos aqueles que nos emprestam sua testa construindo coisas pra se cantar..."

10.1.08

Mais que um simples poeta


Não exalto Chico sozinho; não há quem negue a genialidade desse exímio músico, compositor, teatrólogo, escritor, poeta, poeta, poeta...

Estou a ler um livro chamado "Chico Buarque do Brasil", que traz texto de vários jornalistas e amigos acerca da obra (vida) de Francisco Buarque de Hollanda e um texto em especial me chamou muita atenção. Digamos, uma música em especial. Partamos do princípio que todas (sem exagero) dele têm um pingo de genialidade, toda música chamada de ímpar é pouco.


Em 1981, Chico lançou um álbum chamado de Almanaque, conhecido por todos os bons apreciadores da música buarqueana. A primeira faixa desse álbum é aquela que me fez ver toda a genialidade desse homem; apesar de ouvi-la diversas vezes anteriormente, só atentei para o seu fino lirismo, a poesia, a exuberância de tal esses tempos. Quem conhece "As Vitrines" sabe que, no encarte do "Almanaque", junto à letra, Chico fez um anagrama com a letra dessa música. Um anagrama (quase) perfeito. A música onde a luz a toma do início ao fim, onde a luz é o centro de tudo. Sim, a luz propriamente dita. Luz, luminosidade, energia...

Os letreiros a te colorir/ Embaraçam a minha visão; Já te vejo brincando, gostando de ser/ Tua sombra a se multipicar; Cada clarão/ É como um dia depois de outro dia.

Essa luz que envolve a música, que envolve o eu-lírico - que zela e cuida de sua amada (Passas sem ver teu vigia) -, que envolve a quem quer que seja, transcende n'um espelho, destorcendo os versos da música, letra por letra, formando o que ratifica-o como alguém n'um patamar de percepção acima de qualquer dúvida.


Os letreiros a te colorir (Ler os letreiros aí troco)
Embaraçam a minha visão (Embaçam a visão marinha)
Eu te vi suspirar de aflição (Vi tuas fúrias e predileção)
E sair da sessão, frouxa de rir (Errar sisuda, sã fora de eixos)

Já te vejo brincando, gostando de ser (Doce vento, grandes beijos do jantar)
Tua sombra a se multiplicar (Um militar saber tuas polcas)
Nos teus olhos também posso ver (Bem postos meus veros entolhos)
As vitrines te vendo passar (Patinavas, sorvetes, Diner's)

Na galeria (Na alegria)
Cada clarão( A cara do clã)
É como um dia depois de outro dia (Um doutor doido me cedia poesia)
Abrindo um salão (Um absalão rindo)
Passas em exposição (Pião, sexo, asa, espaço)
Passas sem ver teu vigia (És súpita virgem avessa)
Catando a poesia (A asteca do piano)
Que entornas no chão (Quão sonha no Center)



Só Francisco Buarque de Hollanda para nos presentear com essa perfeição em forma de lirismo, poesia e gramática pura. A sua obra fica mais completa com essa percepção; fica mais bonita de se apreciar.


Um abraço,


Gabriel Parente



PS: Esse anagrama só não é perfeito porque Chico "errou" 3 vezes. Alguém aceita o desafio de procurá-los?

3.10.07

Ele já tem a alma saturada...

Certa vez ouvi o Chico em entrevista, dizendo que ele levou até o Jobim uma determinada canção e notou no mesmo um certo "desdém" em relação a não só esta, mas a outras canções que havia levado em suas últimas visitas ao maestro. Ocorre que, segundo Chico, não havia "desdém" algum, porém, o Tom já havia criado tantas canções ao longo de sua estada no planeta Terra, que o que ele mais queria mesmo, no momento, era ouvir os passarinhos.

Lembrei então de uma frase: "Ele já tem a alma saturada de poesia, soul e rock'n'roll". Segue abaixo a canção na íntegra.

O Homem Velho (Caetano Veloso)

O homem velho deixa a vida e morte para trás

Cabeça a prumo segue rumo e nunca, nunca mais
O grande espelho que é o mundo ousaria refletir os seus sinais
O homem velho é o rei dos animais
A solidão agora é sólida, uma pedra ao sol
As linhas do destino nas mãos a mão apagou
Ele já tem a alma saturada de poesia, soul e rock'n'roll
As coisas migram e ele serve de farol
A carne, a arte arde, a tarde cai
No abismo das esquinas
A brisa leve trás o olor fugaz
Do sexo das meninas
Luz fria, seus cabelos têm tristeza de néon
Belezas, dores e alegrias passam sem um som
Eu vejo o homem velho rindo numa curva do caminho de Hebron
E ao seu olhar tudo que é cor muda de tom
Os filhos, filmes, livros, ditos como um vendaval
Espalham-no além da ilusão do seu ser pessoal
Mas ele dói e brilha único, indivíduo, maravilha sem igual
Já tem coragem de saber que é imortal

2.9.07

"Com que mentira abriste meu segredo?"

Soneto

Por que me descobriste no abandono
Com que tortura me arrancaste um beijo
Por que me incendiaste de desejo
Quando eu estava bem, morta de sono

Com que mentira abriste meu segredo
De que romance antigo me roubaste
Com que raio de luz me iluminaste
Quando eu estava bem, morta de medo

Por que não me deixaste adormecida
E me indicaste o mar, com que navio
E me deixaste só, com que saída

Por que desceste ao meu porão sombrio
Com que direito me ensinaste a vida
Quando eu estava bem, morta de frio

(Chico Buarque)




A facilidade inegavel que Chico tem de falar sobre o universo feminino é simplesmente fantástica. Fantástica ao ponto de atribuir a ele, e com mérito, o título de "Maior conhecedor do sexo feminino". Quem lhe concedeu essa comenda? Eu, é claro. Mas acredito que vocês hão de concordar comigo.
O romantismo, a sensibilidade, a força, a coragem, o sofrimento, a alegria, dentre outros aspectos que ele descreve tão bem em suas músicas são características inerentes à mulher. Essa magnifica parte da obra de Chico começou a aparecer em 1972, que em parceria com Tom Jobim, criou "Tatuagem", depois continuou descrevendo com perfeição os martírios e prazeres da mulher com "O Meu Amor", "Com Açucar e com Afeto", "Folhetim", "Mulheres de Atenas", "A História de Lily Braun", "Gota D'Água", "A Rosa", "Olhos nos Olhos", entre outras.






De fato, a música é a maior forma de encantamento do ser humano. Com isso, Chico nos faz deslumbrar um mixto de amor, ódio, sofrimento e prazer. Além de deliciar-nos com sua poesia.

Ave Chico.




4.5.07

"Só tenho inveja da longevidade e dos orgasmos múltiplos"

O titulo mostra como se caracteriza a nova fase de Caetano. Que ele sempre teve aquela alma Rock n' Roll, os fãs sabiam, apenas não lembravam. Com o disco Cê, Caetano reviveu e se reinventou novamente. Caetano é o que sempre foi: autêntico. Na revista Bizz de dezembro, a qual Caetano foi capa, caracteriza o novo trabalho perfeitamente: "sexual, feliz e impetuoso". "Mucosa roxa, peito cor de rola/ seu beijo, seu texto, seu queixo, seu pêlo, sua coxa". Este é outro trecho que explicita a fase carnal de Caetano.

















Ontem, 3 de maio, eu assisti ao show. Sublime, pagão e forte, ou seja, Caetano Veloso. Cantarolei algumas musicas novas, fui no embalo das que eu nao conhecia, fiz parte do coro em Sampa, dancei a dois em London, London.
Enfim, Caetano se faz triste, sexual, feliz e irreverente. Faz um show alegre, animado, com vontade de repitir a dose. Só espero que ele não demore mais alguns mil anos pra voltar à Belém.

Comprimentos saudosos!










Homem - Caetano Veloso


não tenho inveja da maternidade
nem da lactação
não tenho inveja da adiposidade
nem da menstruação

só tenho inveja da longevidade
e dos orgasmos múltiplos
e dos orgasmos múltiplos

eu sou homem
pele solta sobre o músculo
eu sou homem
pêlo grosso no nariz

não tenho inveja da sagacidade
nem da intuição
não tenho inveja da fidelidade
nem da dissimulação

só tenho inveja da longevidade
e dos orgasmos múltiplos
e dos orgasmos múltiplos

eu sou homem
pele solta sobre o músculo
eu sou homem
pêlo grosso no nariz.

13.2.07

De volta ao samba...

Sim, o blog está de volta. Agora será um pouco repaginado, como tava tão pessoal quanto um blog de coisas pessoais, e não como um blog que reune coisas concretas resolvi torna-lo logo então vitrine de pensamentos que as vezes tenho e se perdem, sem que ele perca a caracteristica de anunciador da bossa. pensamentos estes tidos, quando oculpo os ouvidos com a boa música. Então todo pensamento, seguirá as musicas que me inspiraram a tê-lo.
Como por exemplo hoje. Estava no carro, voltando pra casa já a noite, ouvindo "Ao amigo Tom" de Marcos Valle, Paulo Sérgio Valle e Osmar Milito e me veio a idéia de revitalizar o blog. O melhor é que não é por falta do que fazer, pois agora tempo livre é justamente o que me falta, é por pura paixão a bossa.
Então deixo aqui o soar do bongo , de um reinicio cheio de nova bossa para todos os poucos que por aqui passam. Abraços.























Ao Amigo Tom

(Marcos Valle / Paulo Sérgio Valle / Osmar Milito)

Amigo Tom que bom que você voltou
Não mate de saudade quem te amou
Não brinque de ficar por lá
Se fica a gente aqui
Sem ter o que cantar

Amigo Tom, aqui nada mudou
Não deu ninguém maior que Drummond
Parece que é a insensatez
Tomou conta de vez
E o samba se calou

Ainda tem o azulão
A voar, a cantar
No mar há pesca de arrastão
Marimbás e saltão

Amigo Tom, aqui é o teu lugar
Se alguém de novo te chamar pra lá
Alegue o fim de uma canção
Ou medo de avião
E nunca partas mais

Ainda tem o azulão
A voar, a cantar
No mar há pesca de arrastão
Marimbás e saltão

Amigo Tom, aqui é o teu lugar
Se alguém de novo te chamar pra lá
Porque se depender de nós
Ou de uma oração
Você não volta mais

12.4.06

"Não se afobe, não Que nada é pra já"

O amor não tem pressa Ele pode esperar em silêncio...


E viva o mestre Buarque! O que seria de nós sem as canções do grande Chico? Pouca coisa, com certeza! Nós, os românticos inveterados. Sem sua genialidade para acalmar os afoitos pedindo para que não se afobem, pois nada é pra já... afirmando que o amor não tem pressa e pode esperar, mas que coisa! De onde esse cara tira isso? Sua genialidade é inconteste!

Ave Chico!!!

Que Deus te abençoe!

30.3.06

"De manhã escureço, De dia tardo, De tarde anoiteço, De noite ardo."



A Brusca Poesia da Mulher
(Vinicius de Moraes)

Minha mãe, alisa de minha fronte todas as cicatrizes do passado
Minha irmã, conta-me histórias da infância em que que eu haja sido herói sem mácula
Meu irmão, verifica-me a pressão, o colesterol, a turvação do timol, a bilirrubina
Maria, prepara-me uma dieta baixa em calorias, preciso perder cinco quilos
Chamem-me a massagista, o florista, o amigo fiel para as confidências
E comprem bastante papel; quero todas as minhas esferográficas
Alinhadas sobre a mesa, as pontas prestes à poesia.

Eis que se anuncia de modo sumamente grave
A vinda da mulher amada, de cuja fragrânciajá me chega o rastro.
É ela uma menina, parece de plumas
E seu canto inaudível acompanha desde muito a migração dos ventos
Empós meu canto.

É ela uma menina.
Como um jovem pássaro, uma súbita e lenta dançarina
Que para mim caminha em pontas, os braços suplicantes
Do meu amor em solidão.

Sim, eis que os arautos
Da descrença começam a encapuçar-se em negros mantos
Para cantar seus réquiens e os falsos profetas
A ganhar rapidamente os logradouros para gritar suas mentiras.

Mas nada a detém; ela avança, rigorosa
Em rodopios nítidos
Criando vácuos onde morrem as aves.
Seu corpo, pouco a pouco
Abre-se em pétalas...
Ei-la que vem vindo
Como uma escura rosa voltejante
Surgida de um jardim imenso em trevas.
Ela vem vindo...
Desnudai-me, aversos!
Lavai-me, chuvas!
Enxugai-me, ventos!
Alvoroçai-me, auroras nascituras!
Eis que chega de longe, como a estrela
De longe, como o tempo
A minha amada última!